31.03.2012 - 19:12 Por Jorge Marmelo, Abel Coentrão
As áreas metropolitanas de Lisboa e do Porto poderiam assumir um cojunto de competências actualmente nas mãos do Estado e executá-las, com a mesma qualidade de serviço para os cidadãos, com um orçamento 10% inferior ao da administração central. Se fossem descentralizadas atribuições nas áreas do desenvolvimento económico, mobilidade, ordenamento do território e ambiente, emprego e solidariedade social, educação, cultura, segurança e protecção civil, a poupança poderia ir dos 125 aos 180 milhões de euros, refere um estudo da Faculdade de Economia da Universidade do Porto, encomendado pela Junta Metropolitana do Porto (JMP).
O presidente da JMP, Rui Rio, apresentou ontem este trabalho, pedido àquela faculdade depois de o ministro Miguel Relvas ter desafiado as áreas metropolitanas a conceberem a sua própria proposta de reforço de competências. O estudo pedido à FEP tem por base uma outra análise, esta comparativa, de várias áreas metropolitanas da Europa (ver infografia), com diferentes níveis de competências e diferenças, estas abissais, de orçamento para as executar, em relação à realidade portuguesa, que é também a mais centralizada. No nosso país, o número de atribuições possíveis de serem executadas ao nível metropolitano nem é tão pequeno assim, como se pode ver. A questão é que os recursos para as levar a cabo são escassos.
Se o Governo aceitasse descentralizar competências nas áreas apontadas pela FEP (que as coloca sob a alçada de secretarias metropolitanas), a Área Metropolitana do Porto precisaria de 1099 milhões de euros para as executar. Este valor atribui à região a responsabilidade pelo pagamento do pessoal docente até ao secundário, alocando desta forma ao ensino a grande fatia (654 milhões) dos custos. Numa versão mais minimalista, em que o Estado continuasse a pagar aos professores, o orçamento baixaria para 493,2 milhões. Ainda assim, esse valor seria quase 200 vezes superior ao actual, que ronda os 2,5 milhões de euros. E "há aqui uma área que está fora e que é admissível que deva estar parcialmente dentro, que é a da saúde", assinalou ontem Rui Rio, referindo-se, no caso, não os hospitais, mas aos centros de saúde.
A FEP considera que, num primeiro ano, deveriam ser transferidas para as duas regiões metropolitanas (Lisboa e Porto) apenas 90% das verbas que o Estado gasta para suprir as necessidades regionais nas áreas propostas. E num período sensível de combate ao défice público, os autores do estudo defendem, notou Rio, que "deve ser inscrita a regra de ouro das finanças públicas em que o saldo corrente tem de ser sempre positivo, ou seja, as receitas correntes sempre superiores às despesas correntes". "E, se se vier a entender que as áreas metropolitanas devem poder ter endividamento, esse deve ser sempre inferior a 50% do total das receitas próprias da área metropolitana", frisou.
De fora deste trabalho da FEP, ou quase, ficou a questão da legitimidade democrática de uma área metropolitana com poderes reforçados. Ao contrário de Rio, o ministro Miguel Relvas considera que a eleição directa de um líder metropolitano é, neste momento, uma questão secundária. Mas a FEP aponta como "natural" que também este aspecto venha a merecer uma alteração, face à mudança do quadro de competências.
Estudo será base para proposta a apresentar a Miguel Relvas
A Câmara de Gaia é a mais populosa da área metropolitana do Porto, mas não vai ficar associada à proposta de descentralização administrativa ontem apresentada pela Junta Metropolitana do Porto (JMP). Tal como tem sido habitual, nem sequer esteve representada na reunião que ontem aprovou o estudo e seu presidente, Luis Filipe Menezes, não tem escondido a sua desconfiança relativamente a este processo. E não é o único que tem dúvidas. Guilherme Pinto, o socialista que preside à Câmara de Matosinhos, aprovou ontem o estudo, "porque não se pode ser sempre do contra", mas disse ao PÚBLICO que ficou desapontado com o documento. "Estava à espera de ver ali as competências das câmaras que passam a ser geridas ao nível metropolitano, mas não vi nada. O estudo tem que ser muito aprofundado. Não acho que seja possível ir negociar com base apenas nas competências do Estado que passam para as áreas metropolitanas", disse o autarca de Matosinhos.
Rui Rio, em conferência de imprensa, reconheceu que as poupanças que o estudo considera poderem resultar da transferência de competências referem-se ainda apenas aos serviços agora sob responsabilidade da administração central, não estando equacionado o valor a transferir dos orçamentos municipais. "Essa é a parte mais fácil, podemos ter esse valor quase de um dia para o outro", garantiu o autarca. O fundamental, acrescentou, é que o orçamento metropolitano possa ser menor do que a soma dos vários orçamentos que actualmente existem; e que as regras de controlo do endividamento sejam "muitíssimo apertadas".O presidente da Câmara do Porto reconheceu ainda que a concretização do plano de descentralização poderá ser "gradual". "De outro modo é dificílimo, se não mesmo impossível", disse o autarca que também preside à JMP. Rio salientou ainda que o estudo servirá de base à proposta que irá ser apresentada ao ministro Miguel Relvas, embora ainda seja passível de algumas alterações pontuais. O presidente da JMP manifestou, por exemplo, "algumas dúvidas" sobre a gestão metropolitana da área da habitação social, prescrita pelo documento. Mas, considerou, "se isto for bem feito, o potencial de ganho pode ser brutal".
Fonte: Jornal Público
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